terça-feira, 31 de julho de 2012

Direito à habitação (3)

Habitações decentes

Nuno Teotónio Pereira: Os milhares de casas vazias no país “são um espólio muito importante, que deveria ser aproveitado para realojar as famílias.”

Em 1993, numa das suas crónicas no PÚBLICO (reunidas no livro Tempos, Lugares, Pessoas), defendia que “só com uma forte intervenção da administração central será possível proporcionar habitações decentes às populações”. E recordava que o problema da habitação não se resumia à questão das barracas.

Hoje, ainda tem um olhar crítico sobre o tema: “Há muitos aspectos que são ignorados na luta política e na acção do Governo”. E, sobre o caso da Amadora, diz: “É um recuo muito grande em relação a situações anteriores. A câmara diz que quem não está inscrito no PER [Programa Especial de Realojamento] não tem direito a ser realojado em novos bairros sociais. O PER já tem 20 anos e as pessoas que não foram recenseadas nessa altura não têm direito a ser realojadas em novos bairros sociais. É uma situação dramática e caricata.”

O problema da habitação, diz ainda, passa pelos milhares de casas vazias que há no país: “São um espólio muito importante, que deveria ser aproveitado para realojar as famílias que estão a viver em péssimas condições.” E, acrescenta, “a principal acção para solucionar o problema da habitação devia ser dirigida para aproveitar esses milhares de casas desabitadas”. O Governo deveria mesmo investir num “plano que abrangesse todas as situações de carência de habitação”, com “a colaboração das câmaras”.

Nem só de habitação se fazem as preocupações de Teotónio Pereira. Na cerimónia de entrega do prémio, o arquitecto disse que não nos devemos conformar com a actual situação do país. Agora, explica, “preocupam-me as desigualdades enormes que existem. Deviam ser atenuadas aplicando as medidas de austeridade não só à maior parte da população, mas principalmente às pessoas que auferem grandes rendimentos.”

Teotónio Pereira diz que lhe faz “muita impressão não haver redução dos rendimentos dos que têm mais dinheiro”. A competência de redistribuição que compete aos governos, acrescenta, “devia ser desenvolvida nesse sentido”. Estes factos levam-no a confessar-se desiludido com aspectos desta democracia: “É uma democracia política, mas não é uma democracia no sentido mais lato, de maneira a proporcionar condições de vida satisfatórias à maior parte da população.” Mas também o preocupa a situação em que vivem tantos colegas de profissão: “Há casos de desemprego dramáticos. É uma situação que atinge outras profissões, infelizmente os arquitectos não são as únicas vítimas desta crise. Mas são dramáticas as situações em que quase todos estão a viver. Sobretudo os jovens, que não têm trabalho.”

(excertos de uma entrevista no Público de 29 de Julho de 2012)

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